quinta-feira, 31 de maio de 2012
Em Porriño
Depois de me instalar no albergue e de tomar duche saí para comer qualquer coisa. Coxeava um bocadinho porque fiquei com uma dor na virilha esquerda, talvez por causa do peso da mochila (9 kg, não consegui fazer por menos porque só a farmácia pesava metade!). Continuava tudo deserto. Encontrei-me novamente com o casal de peregrinos que tinha visto antes e que me pediram para tirar algumas fotos; dizem-me que já comeram, que vão para o albergue, que nos encontramos depois e se quero jantar com eles. Digo que sim e depois de comer dou um passeio pela povoação mas como coxeio cada vez mais resolvo ir descansar. Leio um pouco e escrevo na agenda que levei (foi a primeira e a última vez que o fiz porque nunca mais tive tempo). Durante o jantar juntou-se-nos um casal italiano (Pina e Pier António) de Turim e fico a saber que afinal as duas pessoas que encontrei não eram um casal mas sim dois peregrinos que faziam a caminhada sozinhos e tinham saído juntos de Tui. Ela (Helena) é Costariquenha mas vive há 30 anos em Estocolmo, ele é Italiano (Paulo) de Génova e esteve alguns anos na Argentina. Tivemos os cinco uma agradável conversa em “Portunholiano”.
Lembro-me que nessa noite depois de ter adormecido, já a madrugada ia alta, sonhei com uma canção de Jorge Palma.
terça-feira, 29 de maio de 2012
Pequenas histórias da minha peregrinação pelo Caminho Português de Santiago
O ano passado quando fiz a caminhada a Santiago com o Zé, pensei que um dia a iria fazer sozinha. Já está. Já a fiz. Correu muito bem, e foi durante essa semana, enquanto percorria o caminho que encontrei o lindo Oásis no meu deserto.
19 de Maio de 2012, Sábado
Apanhei a camioneta para Valença do Minho às 13h em Lisboa e segui sozinha rumo à aventura. Nesse dia fiquei no albergue de Valença, apesar da chuva que caía quando cheguei ainda dei um passeio pela fortaleza.
20 de Maio de 2012, domingo (Etapa Valença/Tui - Porriño: 16 km = 21.333 passos)
Depois de uma noite mal dormida levantei-me às 6h da manhã e fiquei em pânico quando dei conta de que chovia torrencialmente.”Não posso de maneira nenhuma sair assim.” Voltei a deitar-me mas não consegui sossegar. Levantei-me novamente e arranjei-me; às 7h estava pronta para sair, foi então que a chuva parou e aí aproveitei para me fazer ao caminho. O céu estava tão escuro que parecia que me ia engolir (não engoliu!). Foi com alívio e entusiasmo que atravessei a ponte para Tui e à medida que ia avançando o céu ia clareando. Vinte minutos depois atravessava a fronteira e entrava em terras de “nuestros hermanos.”
Depois de passar pela Catedral de Tui parei para tomar o pequeno-almoço e pôr o primeiro carimbo (selo) na minha Credencial do Peregrino para ter direito à Compostela ao chegar a Santiago.
A partir daqui continuei o caminho sem qualquer problema de orientação porque está muito bem sinalizado com marcos (com os quilómetros que faltam para Santiago) vieiras estilizadas e setas amarelas. Costumo dizer que me perco mais facilmente a conduzir em Lisboa do que ir a pé a Santiago.
Seguindo por uma bela vereda cheguei a um sítio chamado Ponte das Febres; aqui existe um cruzeiro que assinala e testemunha a morte de São Telmo, bispo de Tui, no regresso da sua peregrinação a Santiago.
Continuei a minha caminhada sozinha enredada com os meus pensamentos até chegar ao alto de Orbenile, onde me encontrei com os dois primeiros peregrinos de quem vou ficar grande amiga. No entanto prossegui sozinha e na descida para Porrinõ recomeçou a chover. Antes de chegar ao albergue tive de atravessar o árduo polígno industrial de Porriño, que é uma das partes mais entediantes e desinteressantes do caminho; isto porque é uma recta de 4 kms apenas com fábricas e pedreiras de um lado e do outro (se algum dia fizerem este caminho no início da recta apanhem um táxi e saiam antes do albergue por causa do alojamento; claro que isto fica só entre nós).
Finalmente por volta das 14 horas cheguei ao albergue onde terminei a minha primeira etapa. Escusado será dizer que não encontrei vivalma ao atravessar a povoação. Está-se mesmo a ver porquê: SIESTA.
Primeira comunhão da Joana
- Então Joana?! E ela riu-se.
Passou-se bem.
segunda-feira, 28 de maio de 2012
Os livros que li durante estes dias
“ Em 1939, com a guerra a acabar de ser declarada, um grupo de pessoas privilegiadas embarca no mais luxuoso avião de sempre, o Pan American Clipper, com destino a Nova Iorque: um aristocrata britânico, um cientista alemão, um assassino e a sua escolta, uma jovem em fuga do marido e um ladrão encantador mas sem escrúpulos. Durante trinta horas, não há escapatória possível desse palácio voador. Sobre o atlântico, a tensão vai crescendo até finalmente explodir num clímax dramático e perigoso.”
Este foi um dos livros que também me fez explodir num clímax delicioso de leitura.
“Todos temos dentro de nós uma insuspeita reserva de força que emerge quando a vida nos põe à prova.”
"... Talvez não fizessem nada que não tivessem feito com outros, mas é muito diferente fazer amor amando."
Isabel Allende, “A Ilha Debaixo do Mar”
Trata-se da história do extraordinário percurso de vida de Zarité, uma escrava dos finais do século XVIII, natural de Saint-Domingue. Apesar de ter nascido escrava, esta mulher foi abençoada à nascença com uma “boa estrela” que a terá dotado de uma incondicional força e coragem, de um amor e uma bondade natural inquestionáveis…
Mais um livro brilhante desta escritora que me deixa saudades depois de terminada a leitura.
“Patrmónio” é a recriação dos últimos anos de vida de Herman Roth, 86 anos, após a morte súbita da mulher e de lhe ter sido diagnosticado um tumor cerebral.
É uma história verdadeira, crua, repleta de amor, medo e dor, onde transparece a admiração do autor pelo pai, judeu teimoso, que trava uma luta desigual com o tumor que o irá matar.
É também, um poderoso livro de boas e más memórias, de partilha, de preparação para a terrível perda de um progenitor.
Este texto não é ficção e como tal a sua leitura nem sempre é fácil, mas eu adorei.
(…) Ao ver-me, pouco faltou para se desfazer em lágrimas. Numa voz tão desolada como alguma que eu jamais ouvira, dele ou de qualquer outra pessoa, disse-me aquilo que não me tinha sido difícil de supor:
- Caguei-me.
Havia merda por todo o lado, espalhada pelos pés no tapete da casa de banho, a escorrer pelas bordas da sanita e, aos pés dela, numa poia no chão. Esparramada no vidro do nicho do chuveiro do qual ele acabara de sair e amontoada nas roupas que despira. E no canto da toalha com a qual começara a enxugar-se. Naquela pequena casa de banho, que geralmente era a minha, ele fizera os possíveis para sair daquela imundice sozinho, mas como estava quase cego e acabado de sair de uma cama de hospital, ao despir-se e entrar no chuveiro conseguira apenas espalhar a porcaria por todo o lado. Vi que chegara, até, às pontas das cerdas da minha escova de dentes, suspensa do suporte por cima do lavatório.
- Pronto, não se preocupe – disse eu. – Tudo se vai resolver.
(…) levei a malcheirosa fronha para o andar de baixo, meti-a num saco de lixo preto, que atei bem atado, transportei o saco para o carro e atirei-o para a bagageira, a fim de o levar para a lavandaria. Agora que o trabalho estava feito, não poderia ser mais claro para mim o motivo por que isto estava certo e como devia ser. O património era, então, isso. E não porque limpar a porcaria fosse simbólico de qualquer outra coisa, porque não era; antes por não ser nada menos nem nada mais do que a realidade vivida que era.
Ali estava o meu património. Não era o dinheiro, não eram os filactérios, não era a tigela de barbear: era a merda. (…)
Olá! Encontrei um lindo Oásis no meu deserto.
“ Porque quem ama nunca sabe o que ama, nem sabe porque ama, nem o que é amar.
Amar é a eterna inocência, e a única inocência, não pensar…”
Fernando Pessoa
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